1,5 milhão na lista de inadimplentes em 3 meses. Clientes devolvem espontaneamente, mas bancos não têm interesse em receber carro
A inadimplência no financiamento de veículos para pessoas físicas está estacionada em 3,9% desde dezembro, segundo o Banco Central (BC), mas empresas de recuperação de crédito registram um salto na retomada de automóveis por causa de atraso nos pagamentos.
Na carteira da Siscom, empresa que presta serviço de recuperação de crédito de veículos para sete bancos em todo o país, houve um aumento de 21,4% no número de veículos retomados entre janeiro e julho deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. Segundo Satoshi Fukuura, presidente da empresa, tem havido uma quantidade surpreendente de entregas “amigáveis”, ou seja, em que o cliente admite sua incapacidade de honrar o financiamento e devolve o bem, sem que haja ordem judicial. Esse tipo de devolução cresceu 35% na carteira da Siscom, enquanto a retomada pela via judicial registrou aumento de 13,24%.
De acordo com Fukuura, o aumento é fruto da lentidão econômica e não da legislação de 2014, que agiliza a retomada de carros e motos com pagamento em atraso, já que os gargalos na Justiça seguem tornando o processo moroso.
— Em nossas pesquisas sobre a causa da inadimplência, vemos que a capacidade de pagamento do consumidor tem sido corroída pelo descontrole financeiro provocado pelos aumentos nas contas de água e luz e, claro, pela perda do emprego. Ficamos sediados no ABC paulista e, aqui, por exemplo, o desemprego é um motivo relevante — afirmou Fukuura.
Segundo a empresa, o percentual de recuperação de veículos com pagamentos em atraso da Siscom é de cerca de 60%.
— Depois da casa, o carro é a última coisa que o cliente aceita devolver. Isso só acontece quando ele não vê qualquer saída. Por isso estamos vendo tanta gente de boa fé devolver o bem.
BANCOS PERDEM INTERESSE
Leonardo Corrêa Leal, diretor-executivo de outra empresa de cobrança, a Proativa, observa que a profundidade da crise atual tem feito muitos bancos perderam o interesse em recuperar os automóveis. Em vez desse desfecho drástico, segundo ele, as instituições têm preferido oferecer promoções aos devedores, para reaver de forma ágil pelo menos parcela do crédito.
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— Os pátios das montadoras estão lotados, há uma dificuldade enorme para vender veículos. Os bancos sabem que, se o carro for a leilão, haverá depreciação do bem. Além disso, o veículo às vezes é devolvido com multas e avarias. Dependendo da estratégia do banco, não vale a pena — afirmou Leal, cuja carteira, focada em veículos com atraso superior a um ano e meio, cresceu 20% nos últimos 12 meses.
A saída encontrada por muitos bancos é renegociar com condições mais favoráveis aos clientes.
— A campanha que se fazia no fim de ano, por causa do 13º salário, agora está sendo feita o ano inteiro. Dependendo do tempo em atraso, alguns bancos concedem até 100% de desconto na multa e nos juros. Outras vezes, realoca para o fim do contrato as parcelas não pagas. O objetivo é colocar o devedor em dia — acrescentou.