A possibilidade de flexibilizar o horário de almoço ou de descanso por meio de acordo coletivo, conforme projeto (PLS 8/2015) em tramitação na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), dividiu opiniões em audiência pública no dia 15 de julho.

Contrários à alteração, juízes e procuradores alertaram para os riscos à saúde e à segurança no trabalho que a redução pode ocasionar. Representantes de confederações de diversos setores da economia citaram a liberdade de escolha dos funcionários e outros ganhos, como menos horas no trânsito e mais tempo de convivência com a família ao evitar a saída no horário de pico, para defender a modernização da lei.

Na opinião da procuradora do Ministério Público do Trabalho Juliana Carrero, as negociações coletivas devem ser prestigiadas, sim, mas não em relação a toda e qualquer pactuação. Segundo afirmou, o intervalo intrajornada de no mínimo uma hora para quem trabalha mais de seis horas seguidas é uma medida de segurança e saúde no trabalho, é impositiva e não pode ser afastada pelo trabalhador se ele quiser.

– O trabalhador não tem noção do que efetivamente pode decorrer de uma redução desse tipo na jornada dele. Não pode dizer simplesmente “eu quero a redução”, não interessa, da mesma forma que ele não pode dizer que quer trabalhar 10, 12 horas por dia – defendeu.

Da mesma forma, o juiz Luiz Antonio Colussi, representante da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), frisou que a garantia de saúde e segurança dos empregados contra o texto. O intervalo intrajornada é essencial para que os funcionários reponham energias e mantenham a concentração e o foco no trabalho, para dificultar a ocorrência de acidentes.

O mesmo motivo foi apontado por José Carlos Torves, da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), que também é  contrário à proposta. Segundo lembrou, a situação dos jornalistas é ainda pior, por trabalharem até 10, 12 horas por dia, muitas vezes em situação de risco, sob forte cansaço e estresse, e a jornada de cinco horas garantida por lei nunca ser cumprida. Ele também alertou para a existência de um movimento de ataque ao mundo do trabalho e aos trabalhadores, com retirada de direitos e garantias. Apontou como exemplo disso a MP 680/2015, que permite a redução da jornada e dos salários.

– Óbvio que há necessidade de superar a crise, mas [as medidas] não podem cair só sobre os direitos dos trabalhadores – afirmou.

Projeto

A alteração proposta na regra de intervalo para repouso e alimentação estabelecida pela Consolidação das Leis do  Trabalho (CLT) tem na CAS relatório pela rejeição, apresentado pela senadora Angela Portela (PT-RR), e um voto em separado da senadora Ana Amélia (PP-RS), defendendo sua aprovação.

Vários senadores defenderam modificações na proposta. Waldemir Moka (PMDB-MS) pediu que a redação do texto seja mais claro, diferenciando segmentos econômicos em relação aos quais não se aplicaria a flexibilização.

Paulo Paim (PT-RS) sugeriu que não se coloque a proposta em votação enquanto centrais sindicais e outras federações de trabalhadores não forem ouvidas.

– Às vezes uma boa intenção pode gerar prejuízos para os mais fracos – disse.

Já a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) destacou a necessidade de levar em consideração os argumentos dos juízes e procuradores do Trabalho. Segundo ela, a Justiça do Trabalho mantém o equilíbrio das relações trabalhistas no país, uma vez que o lado do poder econômico – representado pelos empregadores – é mais forte.

Valorização

Para o representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Kurtz, o projeto valoriza as negociações coletivas de trabalho, representando assim um avanço para as relações trabalhistas. Ele também lembrou que as negociações coletivas só se estabelecem quando há interesse das duas partes, não é unilateral.

– Melhor trabalhar meia a hora a mais durante a semana [reduzindo o almoço] para ficar no sábado com sua família – disse.

Alain Mac Gregor, representante da Confederação Nacional do Comércio (CNC), afirmou que o projeto traz facilidades para o mundo do trabalho e fortalece os sindicatos. As negociações, afirmou, seriam feitas sob lastro constitucional e com previsão em dispositivo constante do parágrafo 3º do artigo 71 CLT. Ele permite que o intervalo seja reduzido por ato do Ministro do Trabalho, com condicionantes: que seja ouvido o Serviço de Alimentação de Previdência Social, que o estabelecimento atenda às exigências sobre organização dos refeitórios e que os empregados não estejam sob regime de trabalho prorrogado em razão de horas suplementares. O texto aprovado tornaria o processo menos burocrático, avaliou.

– Não existem mais fragilidades na representação sindical. O trabalhador representado jamais sofrerá prejuízos por negociações de sindicatos, que estão ali para protegê-lo – frisou.

Rodrigo Valente, representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), ressaltou que é por meio das negociações coletivas, via acordos e convenções coletivas de trabalho, que as reais necessidades das categorias são atendidas.

O autor da proposta, senador Blairo Maggi (PR-MT), disse que o projeto busca adequar as relações de trabalho ao mundo real. Não é nada imposto, faz quem quer e por acordo, mas exceções devem ser observadas, como o setor da construção civil, trabalho braçal e pesado que demanda mais descanso.

– As pessoas têm que ter discernimento de definir sua vida. O Estado não pode tutelar tudo e a todos a qualquer momento – afirmou.

Na opinião de Ana Amélia (PP-RS), não se pode comparar coisas diferentes, tratando todos os setores da atividade econômica da mesma forma. Alguns mais vulneráveis precisam da proteção do Estado, mas há outros mais modernos em que o cidadão poderia exercer sua liberdade de escolha. Conforme a senadora, é preciso desmistificar a visão do trabalhador como alguém sempre explorado pelo empregador. Na mesma linha, o presidente da CAS, senador Edison Lobão (PMDB-MA) frisou que empresas e trabalhadores não existem um sem o outro.

– As legislações precisam ser sempre atualizadas. Algo que foi construído há 40, 50 anos, quando o trabalho era diferente do que é hoje, não podemos imaginar que hoje é mais adequado. Mas que os princípios e direitos se mantenham porque são corretos e justos e devem preservar o trabalhador – opinou ainda Douglas Cintra (PTB-PE).

Fonte: Agência Senado