Entre 2014 e 2015, o envio de trabalhadores por multinacionais brasileiras para o exterior subiu 65%, enquanto empresas estrangeiras reduziram em 19% o número de trabalhadores de outros países nas filiais no Brasil; pesquisa ouviu 220 companhias.
Uma pesquisa que acompanha a mobilidade de funcionários em multinacionais no Brasil identificou um novo fenômeno: o aumento na transferência de profissionais do Brasil para outros países. O movimento tem uma razão básica. A crise econômica. A recessão reduz a perspectiva de crescimento profissional no Brasil e frustra a receita das empresas, exigindo corte de custos.
A pesquisa, conseguida em primeira mão pelo Estado, foi respondida pela área de Recursos Humanos de 220 multinacionais instaladas no País – tanto empresas estrangeiras com unidades no Brasil quanto empresas brasileiras com operações globais. Tratam-se de grandes corporações: 53% delas possuem mais de 10 mil funcionários e 76% têm sede fora do Brasil. O levantamento é realizado pela Global Line, empresa de treinamento e consultoria especializada em desenvolvimento de equipes, em parceria com a Worldwide ERC, associação sem fins lucrativos, que atua na gestão global de talentos.
“É o quarto ano que fazemos o levantamento no Brasil e esta é a primeira vez que aparece um movimento de saída do País com esta intensidade”, diz Marcelo Ribeiro, sócio da Global Line. “Não há dúvida que é reflexo da crise.”
O dado que mais impressiona Ribeiro é o verdadeiro êxodo de brasileiros. Nas multinacionais verde-amarelas, o número de brasileiros que migrou e agora trabalha lá fora aumentou em 65% entre 2014 e 2015. Mas houve um grande volume de saída de estrangeiros também. Empresas estrangeiras instaladas aqui reduziram em 19% o número de trabalhadores de outros países.
Há duas razões básicas acirrando o movimento de saída do Brasil, segundo Natacha La Farciola, analista de recursos humanos de uma grande montadora (o nome não pode ser divulgado a pedido da empresa) e presidente do Gadex, o Grupo de Expatriados, associação que reúne 35 multinacionais para periodicamente discutir os grandes temas ligados à gestão global de talentos. A primeira razão é que os profissionais mais qualificados não estão vendo futuro no País e buscam uma carreira internacional. “Uma vivência no exterior pode render um aumento de salário de 10% a 30%, além dos benefícios que se recebe, como casa, carro e bônus”, diz Natacha.
A outra razão, diz a executiva, é que as empresas instaladas no Brasil estão tentando economizar. Um expatriado não é apenas mais caro – pode custar de duas a quatro vezes mais. Ele também é pago pelo caixa do País onde trabalha. “Ao transferi-lo, transfere-se também o custo.” Neste momento, em que a economia brasileira está em recessão, a transferência permite o corte de custo e a preservação do funcionário.
O País, porém, perde talentos. No total, quase 1,5 mil profissionais qualificados deixaram o País de 2014 para 2015. Na verdade, a fuga é altamente qualificada, pois a debandada se deu principalmente entre técnicos especializados e integrantes da alta gestão.
Para complicar ainda mais, um número maior de funcionários bem formados mudou de vez. No ano passado, 55% das empresas utilizaram programas de expatriados para transferências definitivas. Neste ano, este número passou para 73%. Entre os setores que mais utilizam este programa estão o automotivo.
“Tem mais brasileiros indo embora”, diz Ribeiro. “Em parte porque as próprias empresas estão desmontando operações aqui e se mudando para países mais competitivos, como EUA, onde a energia mais barata viabiliza a produção industrial.”
Mudança. Hoje, muitas empresas brasileiras estão vendo mais chances de crescer lá fora do que internamente. Um exemplo é a CI&T, provedora de serviços de tecnologia de Campinas (SP). Segundo César Gon, fundador da companhia, a empresa já tem 30% de sua receita, que deve chegar a R$ 330 milhões em 2015, vinda da operação nos EUA. E o objetivo é ampliar ainda mais a fatia estrangeira, com uma forte aposta no mercado chinês.
Gon diz que é necessário levar brasileiros para abrir a operação. Nos EUA, onde a empresa está presente há mais de dez anos, 60% da equipe ainda é verde-amarela. O empresário diz que os funcionários que se mostram dispostos a ir para o exterior estão adotando uma nova atitude com a crise atual. “Agora, as pessoas querem ir e ficar lá fora por um bom tempo.
Fonte: O Estado de S.Paulo