Ministro Nelson Barbosa, da Fazenda, sofre pressão para liberar uso de multa do FGTS para trabalhador quitar empréstimo consignado; com 1.5 milhão de demitidos em 2015, bancos temem explosão da inadimplência no País; tentativa de mudar regras se dá depois de longo período de ganhos financeiros na modalidade.

O crédito concedido com desconto em folha de pagamento, o famoso ou famigerado crédito consignado a depender da situação financeira do trabalhador que o faz, é uma operação com risco relativamente pequeno para os banqueiros e financeiras, já que é um empréstimo que é descontado diretamente em folha de pagamento.

De acordo com a Serasa Experian, o risco, via de regra, está associado à probabilidade de falência da empresa ou à hipótese de demissão do empregado.

Com a crise econômica que contaminou vários setores da economia (exceto o setor financeiro) ao longo de 2015, os dois fatores de risco (falência das empresas e desemprego) incidem sobre os empréstimos consignados.

Mas os bancos querem transferir o risco apenas para os trabalhadores e pressionam o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, para que autorize o uso da multa do FGTS, para que o trabalhador acerte o empréstimo consignado quando for desligado da empresa.

Segundo dados da Boa Vista SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito), “os pedidos de falência no país aumentaram 16,4% no acumulado de 2015, na comparação com o ano anterior; as falências decretadas subiram 16,7% em relação ao período equivalente do ano anterior e os pedidos de recuperação judicial e as recuperações judiciais deferidas registraram alta de 51,0% e 39,3%, respectivamente.

No mesmo período, o Brasil perdeu 1.542.371 postos de trabalho, representando queda de 3,74% em relação ao número total de empregos formais do ano anterior. Afetando a indústria de transformação (608.878 demitidos) e a construção civil (com 416.959 empregos a menos).

Ou seja, a combinação das dificuldades que as empresas enfrentaram ao longo do ano de 2015 com as demissões em massa tiveram um impacto não divulgado pelos bancos e suas financeiras no empréstimo consignado.

Mas o impacto deve ter sido considerável a ponto de fazer com que os banqueiros acionassem os seus lobistas e meios de comunicação para pressionar o governo federal. A pressão foi tanta que o ministro Nelson Barbosa divulgou a intenção dos bancos nas suas entrevistas em Davos, na Suiça, enquanto participava do Fórum Econômico Mundial.

Segundo a Agência Brasil, a proposta que os bancos apresentaram ao ministro é usar o saldo da multa do FGTS, caso o trabalhador perca o emprego. De acordo com o ministro Nelson Barbosa, o argumento das instituições financeiras em defesa da proposta é que, em momento de alta do desemprego, o uso do FGTS reduziria o risco de inadimplência, no caso dos trabalhadores do setor privado e, por consequência, a taxa de juros cairia.

Cauteloso, Nelson Barbosa informou que o governo pediu mais detalhes sobre a proposta às instituições financeiras. “Não tem uma decisão ainda”, disse Barbosa, ressaltando que é preciso confirmar em quanto a taxa de juros seria reduzida e qual seria o impacto no FGTS.

O assunto deve entrar na agenda das centrais sindicais, especialmente da União Geral dos Trabalhadores, que tem uma preocupação continuada com a dilapidação do FGTS.

Já em 2013, a UGT ingressou na Justiça com ações coletivas para resgatar a correção monetária sobre os depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, não aplicada desde 1999.

Segundo a UGT calculou na época em que iniciou a sua ação na Justiça, “o rombo chega a bilhões de reais, pois a correção que deixou de ser aplicada nas contas do FGTS dos trabalhadores, vai de 48,3% a 88,3”.

A central informa, no seu site que “isso faz com que o patrimônio do trabalhador esteja indo para o ralo, por causa das mudanças operadas pelo Governo e Banco Central na remuneração das contas do FGTS”.

O lobby dos bancos tem endereço certo: zerar os débitos dos empréstimos consignados, usando a multa que o trabalhador receberia quando demitido.

O que os bancos querem é que se desconsidere o fato de que os empréstimos foram negociados entre o trabalhador e a instituição financeira levando-se em conta (dos dois lados) a realidade funcional do trabalhador e a saúde financeira da empresa, que na maioria das vezes atua como fiadora da transação.

Mas se tenta, com esse intenso lobby sobre o Ministério da Fazenda responsabilizar apenas os trabalhadores a saldar os empréstimos consignados com parte do FGTS desconsiderando as finalidades legais do fundo.

Segundo esclarece o Ministério do Trabalho, o FGTS, é um patrimônio do trabalhador que só “pode ser sacado em momentos especiais, como o da aquisição da casa própria ou da aposentadoria e em situações de dificuldades, que podem ocorrer com a demissão sem justa causa ou em caso de algumas doenças graves”.

Mesmo sendo continuadamente dilapidado, submetido a uma correção monetária anual de 3% mais a TR (que se aproxima de zero), o FGTS ainda é uma das maiores reservas de investimento do País. O orçamento do FGTS para 2016 é, segundo a Caixa Econômica Federal, de R$ 83 bilhões, aprovado pelo conselho curador do FGTS no final de outubro de 2015.