A entrada maciça de novas tecnologias no ambiente de trabalho causa alívios e apreensões. Se, de um lado, as novas máquinas criam ambientes mais confortáveis, de outro, elas ameaçam desempregar muitos trabalhadores. O que dizer desse dilema?
As visões sobre o assunto são bastante divergentes. Já li vários autores que veem uma verdadeira devastação dos empregos em decorrência da modernização tecnológica. Para eles, a inteligência artificial dos modernos sistemas de informática vai afetar não só as profissões rotineiras de baixa qualificação, como também as interativas de alta especialização. Já li também autores que acreditam na geração de novos negócios e de muitas oportunidades de trabalho em decorrência das modernas tecnologias e, com isso, uma explosão de novos empregos.
Os que defendem a primeira posição preveem o declínio de empregos até para administradores, advogados, médicos e outras profissões que demandam interação humana. Eles citam os exemplos das lojas que, com base em inteligência artificial, já conhecem hoje em dia as preferências dos consumidores para os quais direcionam bens e serviços; os órgãos de investigação policial que usam a análise algoritima para agir preventivamente nos locais e momentos em que os crimes acontecerão; e a medicina, em que computadores fornecem bancos de dados gigantescos que praticamente diagnosticam as doenças e prescrevem os tratamentos.
No mundo da inteligência artificial, tudo o que as pessoas fazem será realizado pelas tecnologias a preços irrisórios, fazendo evaporar a grande maioria dos empregos – é assustador (Martin Ford, Rise of the robots – technology and threat of a jobless future, NY: Basic Books, 2015; e The lights in the tunnel, Acculant Publishing, 2009).
Em posição divergente estão os autores que veem as tecnologias destruindo certos empregos, mas gerando novas oportunidades de trabalho que demandam versatilidade e habilidade analítica dos profissionais do futuro. Para eles, as novas tecnologias não destruirão profissões de forma generalizada e instantânea. Ao contrário, as mudanças atingirão mais umas do que outras e em ritmo gradual. Muitas das “velhas” profissões sobreviverão por um bom tempo, como é o caso, por exemplo, do psicólogo, assistente social, zelador, mecânico de auto e outras (Werner Eichhorst, Do we have to be afraid of the future of world of work?, Bonn: Institute for the Study of Labor, 2015).
Apesar de divergentes, as posições convergem quando os autores analisam o impacto das novas tecnologias nas relações do trabalho. Para eles, haverá uma redução gradativa do emprego fixo e por prazo indeterminado em favor de modos mais flexíveis de trabalhar. O mercado de trabalho ficará mais heterogêneo. A negociação das condições de trabalho tenderá a se mover do âmbito coletivo para o individual, onde as pessoas procurarão conciliar os interesses pessoais com os do trabalho. A empregabilidade dependerá de conhecimento e adaptabilidade.
Neste novo mundo, só sobreviverá quem tiver acesso à educação continuada de boa qualidade. Educar-se será um programa de vida, e não um ciclo escolar.
Além disso, o ajuste das pessoas a um mercado diversificado e variável exigirá a remodelação das políticas de trabalho que hoje protegem apenas os que trabalham com vínculo empregatício. As novas políticas terão de proteger as pessoas, e não os empregos.
Em países onde tudo isso já é realidade (os da Escandinávia, por exemplo), há pouco o que temer com a entrada das novas tecnologias. Onde essa realidade está longe, como no Brasil, temos de fazer de tudo para implantar sistemas de educação continuada e de relações de trabalho flexíveis. Só assim teremos razão para não temer a modernização tecnológica que, convenhamos, é imprescindível para nos tornarmos competitivos.
*Professor da FEA-USP, é presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras