Há poucas chances de pessoas com o mesmo perfil trazerem soluções diferentes para os problemas de uma empresa. Mas as alternativas podem se multiplicar se esses profissionais forem diversos entre si em gênero, raça e classe social. É o que destaca levantamento do Olabi sobre as contradições dos resultados alcançados por companhias onde homens brancos e héteros ainda são maioria. Segundo a organização social, quando a mão de obra não reflete a demografia do país, as empresas correm o risco de criar produtos e serviços que não atendem a complexidade da população.

“Pessoas de perfis diferentes fazem perguntas diferentes e sugerem um olhar mais criativo e inovador”, destaca a codiretora executiva, Gabriela Agustini. Criado em 2014 para ampliar a diversidade nas áreas de tecnologia e inovação, o Olabi observa uma ampliação nas políticas de inclusão no setor. Mas adverte que ainda “há um longo caminho. Principalmente no que se refere à contratação, retenção e treinamento de pessoas negras”, não só no ramo da tecnologia, mas em outros setores também.

 

Maioria da população brasileira, pretos e pardos são 54,9% da força de trabalho, segundo estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil do IBGE, apresentado em 2018. Mas ocupam apenas 29,9% dos cargos gerenciais, ao mesmo tempo em que representavam 64,2% dos desocupados e 66,1% dos subutilizados. Uma desigualdade que se manteve no primeiro trimestre de 2021, quando a taxa de desemprego por cor e raça ficou abaixo da média nacional para brancos, com 11,9%, enquanto para pretos foi de 18,6% e pardos 16,9%.

Políticas de diversidade

O Olabi pontua, por outro lado, que essas contradições podem ser enfrentadas e apresenta um compilado de ideias postas em prática por cinco empresas da área de tecnologia e três consultorias especializadas em promoção de políticas de diversidade. Os conteúdos estão hospedados no site da organização e incluem um ebook, vídeo manifesto e podcasts publicados nas principais plataformas digitais de áudio. O objetivo do material, segundo a organização, é ampliar as reflexões e dar repertório e referência aos CEOs, gestores, administradores e gerentes que queiram adotar ações de diversidade dentro de seus ambientes de trabalho.

 

“Esse é um assunto que está em construção, não tem um manual para seguir. Mas juntar quem está pensando sobre um assunto é uma forma de estimular que essas melhores práticas aconteçam. As empresas precisam priorizar essa agenda, colocá-la no centro de suas estratégias e fazer todos os investimentos necessários”, explica a diretora executiva. “As altas lideranças precisam também estar comprometidas com esse processo. Essa é uma mudança necessária de cultura que envolve como se contratam as pessoas, o modo de gestão. E tudo isso leva tempo e trabalho, mas os resultados são compensadores, não só para as organizações, que podem criar melhores produtos e serviços, como para a sociedade como um todo.” 

Entre as companhias que compartilharam suas experiências estão Google e Microsoft. Também participam as consultorias Carambola, que desenvolve programas educacionais para capacitar profissionais de áreas sub-representadas para a área de tecnologia; Indique Uma Preta, que dá visibilidade aos valores de inclusão e diversidade, especialmente para a comunidade negra, e o Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), que também atua na montagem de planos de diversidade e inclusão para corporações. 

O racismo no mercado de trabalho

Desenvolvedor sênior da ThoughtWorks (TW), uma consultoria global de tecnologia que faz parte do estudo, Lucas Borges garante que as políticas de equidade são fundamentais sobretudo no Brasil, onde, por conta de opressões estruturais, como o racismo e a desigualdade social, as pessoas não partem de um mesmo lugar com as mesmas condições de acesso à renda e ao trabalho. “As dificuldades começam antes do mercado do trabalho em si. Vem desde o inicio da escolarização e do acesso ao conhecimento, historicamente precário para as populações negras”, descreve.  

“Somado a isso existem alguns vieses no momento da entrevista e da contratação. Há situações em que uma pessoa negra é deixada de lado no processo seletivo, enquanto uma pessoa branca, que tem teoricamente o mesmo nível de escolarização, preenche essa vaga”, afirma. “Outra dificuldade é mostrar as referências para a gente ver e falar que dá para chegar lá e ser um líder técnico. Nós vemos pouco essas ‘carinhas’ e não é só ter um rosto negro no seu quadro de funcionários. Essas pessoas precisam ter oportunidades para crescer e mostrar que é possível estar ali, ocupar esses lugares, que seja algo comum. Não o único rosto negro dentro de uma organização, mas sim mais um rosto negro dentro da organização.”

Ganhos sociais

Além do compromisso antirracista, o materialalerta para os resultados com a inclusão de outros grupos, como mulheres, pessoas LGBTQIA+, com deficiência, também historicamente minorias no mercado de trabalho. A diversidade também está, conforme aponta, na contratação de profissionais de diferentes faixas etárias, classes sociais e regiões. No ano passado, um estudo da consultoria estadunidense McKinsey, realizado em 15 países, incluindo o Brasil, indicou que as empresas, que têm a inclusão como parte da estratégia de seus negócios, lucram acima da média no mercado. 

A também codiretora executiva do Olabi, Silvana Bahia, ressalta, contudo, que apesar do apelo econômico, o mais importante é o social. De acordo com ela, as corporações não devem apenas falar em diversidade, mas criar políticas consistentes para contratação e manutenção dessas pessoas nas equipes. 

“São elas que vão garantir que essas ações de diversidade não sejam algo pontual, mas sim ações que modifiquem a cultura da empresa. E isso tem tudo a ver com a ideia de contratar pessoas negras, trans, mulheres, e criar ambientes para que elas possam também se desenvolver plenamente nesses espaços”, avalia a codiretora. “Muitas vezes isso está focado em um setor da empresa, no RH (recursos humanos) ou no marketing. Mas a gente tem aprendido dentro da nossa experiência que se todo o sistema da empresa, e principalmente os gestores, não entenderem que isso é importante, não conseguiremos avançar muito.”

Clara Assunção/RBA