A Justiça do Trabalho em Brasília condenou a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) a pagar uma indenização de R$ 1 milhão por danos morais coletivos por cometer o chamado assédio moral organizacional.

A companhia instaurou processos administrativos disciplinares contra diversos funcionários, após a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios, em 2006, para investigar o recebimento de propina em processos licitatórios por funcionários. Além das investigações terem levado vários anos, os funcionários sob suspeita, de acordo com o processo judicial, foram “isolados” dos demais na Universidade dos Correios, local apelidado de “Carandiru”, onde não tinham atividades a realizar.

A ação foi ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho do Distrito Federal (MPT-DF). Em um período de seis anos, foram mais de 200 procedimentos disciplinares conduzidos dentro da estatal, segundo o órgão. A condenação é da 6ª Vara do Trabalho de Brasília.

O assédio moral é caracterizado por condutas abusivas, de forma sistemática, que resultem na humilhação e constrangimento do trabalhador e pode acarretar em danos morais, físicos e psíquicos.

De acordo com a sentença do juiz Renato Vieira de Faria, o assédio moral abrangeu todas as unidades dos Correios, que possui cerca de 120 mil empregados públicos no país. “Foram atingidos diretamente os trabalhadores submetidos a processos disciplinares irregulares, apesar de todos os empregados estarem potencialmente sujeitos aos mesmos procedimentos”, diz na decisão.

Segundo a sentença, a empresa não pode permitir, tolerar e se abster de práticas que caracterizem o assédio moral, sob pena de multa de R$ 10 mil por trabalhador lesado. O magistrado também obrigou os Correios a disponibilizar e manter em sua intranet, em local de grande visibilidade para os empregados, uma cópia da decisão judicial. Do entendimento ainda cabe recurso.

Segundo o magistrado, o Ministério Público reuniu provas que demonstraram a disseminação de sindicâncias e processos administrativos disciplinares contra empregados, com durações desarrazoadas, sobre acusações antigas e até mesmo já investigadas anteriormente.

O juiz Renato Vieira de Faria constatou que o abuso de poder diretivo e disciplinar contribuiu para “eternização de conflitos, insegurança jurídica, ambiente de intranquilidade e desconfiança permanentes, assim, potencialmente lesivo à saúde psíquica dos empregados públicos”.

Na decisão, ainda entendeu que essas sindicâncias, embora necessárias à gestão de conflitos internos e à resolução até mesmo de problemas de corrupção deflagrados desde o ano de 2005 na estatal, foram conduzidas sem respeitar as leis. “O processo disciplinar não pode continuar sendo exercido de modo arbitrário quando pretendemos evoluir para ambiente democrático em ordem jurídica iniciada com a expressa previsão, na Constituição da República, de normas de devido processo constitucional”.

O valor de R$ 1 milhão arbitrado para pagamento de indenização por dano moral coletivo corresponde a 3% do último lucro líquido divulgado pelos Correios. O montante será revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ou a instituição sem fins lucrativos indicada pelo Ministério Público do Trabalho para posterior homologação judicial.

A ECT alega no processo que os empregados mencionados foram submetidos a processos administrativos disciplinares durante a vigência do Manual de Controle Interno, entre 2 de dezembro de 1997 e 3 de setembro de 2012. Segundo os Correios, nesse período, não havia previsão de prescrição ou de procedimento preparatório de investigação, o que explicaria a demora das sindicâncias.

A ação teve origem com uma denúncia da Associação dos Profissionais de Níveis Superior, Técnico e Médio da ECT ao Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal (MPT-DF).

A procuradora do MPT do Distrito Federal Renata Coelho, contudo, afirmou que deve recorrer para tentar elevar os valores de indenização. O MPT tinha pedido valor superior a R$ 5 milhões. “O valor de indenização tem que levar em consideração o porte da empresa e diante do lucro da companhia, achamos pouca a quantia de R$ 1 milhão”.

Como a sentença tem eficácia imediata, a procuradora afirma que fiscalizará os Correios para verificar a suspensão da prática, sob pena de multa de R$ 10 mil por trabalhador. “A prática dos Correios em manter esses trabalhadores por anos sem que seu processo administrativo fosse julgado é muito sutil e faz com que trabalhadores, sem saber dos seus direitos, se submetam a tudo, como péssimas condições de trabalho, na espera de que o processo seja analisado”.

Por nota ao Valor, a assessoria de imprensa da ECT informou que “os Correios já foram notificados da decisão e interporão o recurso cabível”.

Fonte: Valor Econômico