Com foco em infraestrutura e energia, Brasil e China vão finalmente tirar do papel um fundo de US$ 20 bilhões para financiar investimentos asiáticos no mercado brasileiro. O memorando de entendimentos que cria o fundo bilateral de expansão da capacidade produtiva será assinado, em Pequim, e a intenção dos dois lados é que ele esteja funcionando até o fim deste ano.
Os recursos serão liberados conforme a demanda e só poderão ser acessados por empresas brasileiras ou chinesas. A China injetará US$ 15 bilhões e o Brasil colocará os US$ 5 bilhões restantes. Não necessariamente haverá aporte específico para esse fundo, que atuará como um agente para receber as demandas e organizar a aplicação dos recursos comprometidos. “É um mecanismo de coordenação dos recursos para viabilizar os projetos”, afirmou ao Valor o ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira.
Ele explicou que esse apoio pode ser dado tanto por meio de financiamento como por meio da compra de papéis emitidos pelas empresas ou pelos próprios projetos. Do lado brasileiro, haverá redirecionamento de dinheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ou do FI-FGTS, por exemplo, além de outras fontes a serem mapeadas, como captações no setor privado. “No Brasil, nós vamos captar de fontes existentes”, explicou o ministro.
Do lado chinês, o veículo para o aporte de recursos vem do China Latin American Industrial Cooperation Investment Fund (Claifund). “É natural que os aportes sejam pari-passu nessa proporção [de US$ 3 da China para US$ 1 do Brasil]”, acrescentou.
Para o ministro, a prioridade serão os projetos listados no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e os recursos do fundo constituem um passo importante nos esforços do governo de diversificar as fontes de financiamento. “Eles têm interesse em projetos de tecnologia avançada, agroindústria, manufatura e serviços digitais. O nosso interesse maior é em infraestrutura logística e energia”, disse Oliveira. “Ficou combinado que o fundo poderá apoiar todas essas áreas.”
Segundo ele, não haverá qualquer tipo de vinculação à compra de equipamentos ou insumos chineses por parte dos tomadores do crédito. “Em hipótese nenhuma”, ressaltou. Durante as negociações, o Brasil fez questão de impedir que os recursos para financiar uma usina hidrelétrica ou uma ferrovia, por exemplo, estejam condicionados à aquisição de turbinas ou trilhos chineses.
O fundo foi concebido originalmente em maio de 2015 pelo primeiro-ministro Li Keqiang e pela ex-presidente Dilma Rousseff. De lá para cá, as conversas esfriaram com a crise política no Brasil e o processo de impeachment. Para o ministro do Planejamento, a criação do fundo mostra que a parceria sino-brasileira é firme e não depende de um governo específico, mas se reveste de um caráter mais estratégico.
Oliveira reconheceu que empresas chinesas, individualmente ou em consórcio, são candidatas naturais a ter acesso aos recursos do fundo e podem ficar bem posicionadas nos próximos leilões de infraestrutura. Os asiáticos têm sido particularmente agressivos na disputa por linhas de transmissão e ampliaram significativamente sua carteira no setor elétrico, com aquisições nas áreas de geração e distribuição.
As decisões sobre a liberação de recursos serão tomadas por um comitê executivo formado por integrantes brasileiros e chineses em igual proporção. Oliveira prefere não estipular prazos entre o recebimento dos projetos e o repasse dos recursos. “Tomando por experiência nossos projetos internos, leva um certo tempo, seis meses, um ano, entre estruturar um projeto e o desembolso. Estamos falando de projetos grandes”, afirmou o ministro.
Recém-chegado dos Estados Unidos, ele disse ter ficado bem impressionado com o humor favorável que investidores locais demonstraram em relação ao país. “Achei que houve boa receptividade, principalmente para o programa de infraestrutura. Voltamos a estar na lista de prioridades. A leitura do Brasil lá fora saiu do negativo e foi para o positivo.”