O Ministério Público Federal (MPF) denunciou nesta segunda-feira à Justiça Federal de Brasília o ex-procurador da República e advogado Marcello Miller, os executivos da J&F Joesley Batista e Francisco de Assis e a advogada Esther Flesch por corrupção.

Em nota, a assessoria de imprensa do MPF sustenta que Marcello Miller, ainda como procurador da República e auxiliado pela advogada Ester Flesch, então sócia do escritório Trench Rossi Watanabe (TRW), aceitou promessa de vantagem indevida no valor de 700 mil reais para orientar os administradores do grupo J&F a celebrar um acordo de confidencialidade com a Procuradoria-Geral da República (PGR), que posteriormente resultou no acordo de colaboração premiada, assinado em 3 de maio de 2017.

Marcello Miller e Ester Flesch foram denunciados por corrupção passiva e os executivos da J&F Joesley Batista e Francisco de Assis e Silva por corrupção ativa. A revelação desse episódio levou o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a rescisão dos benefícios do acordo de delação premiada de Joesley e Francisco (eles tinham ganhado imunidade penal) —a corte ainda não tomou uma decisão final.

A nota cita ainda que, entre fevereiro, data em que anuncia sua saída do MPF, e 5 de abril, data de sua exoneração do cargo, “Miller orientou Joesley Batista, Wesley Batista, Francisco de Assis e Ricardo Saud a obter os benefícios da imunidade, ajudando a redigir anexos, prestando aconselhamentos jurídicos e encontrando-se diversas vezes com seus corruptores”.

A denúncia relata que Miller e Flesch usaram o escritório de advocacia, do qual ela era sócia majoritária, para instrumentalizar o repasse da vantagem indevida, sem o conhecimento dos demais sócios.

“A cobrança abarcava as horas de serviços prestados por Marcello Miller, inclusive no período anterior a 05/04/2017 (data de sua exoneração), vantagem que não pode ser considerada devida, pelo fato de que Miller, à época, ainda não tinha contrato com o TRW e era procurador da República”, aponta a acusação.

Segundo a denúncia, todas as evidências apontam que Joesley e Francisco conheciam a condição de procurador da República de Marcello Miller e que tinham a real expectativa de que, no exercício do cargo de procurador e integrante do grupo de trabalho de Janot, Miller poderia facilitar ou lhes ajudar na celebração de acordo de colaboração premiada com a PGR.

A acusação cita que Miller era um renomado integrante do grupo de trabalho, especializado em acordo de colaboração premiada e, assim, os empresários ofereceram promessa de vantagem indevida a ele.

“Era a pessoa certa para, valendo-se do cargo, orientar juridicamente a interlocução entre corruptores e seus colegas de PGR e minutar documentos, inclusive porque tinha livre acesso aos membros integrantes do citado GT-Lava Jato e poderia interferir, pela sua experiência no assunto e pela respeitabilidade até então existente entre seus pares, nas decisões adotadas em relação a acordos de colaboração”, afirma a peça.

A acusação criminal foi encaminhada à 15ª Vara Federal do DF e está em segredo de Justiça, informou a assessoria de imprensa da Justiça Federal de Brasília.

Em nota assinada pelo advogado André Luís Callegari, a defesa de Joesley reafirma que o “empresário jamais contratou, pagou, ofereceu ou autorizou que fosse oferecida qualquer vantagem indevida ao senhor Marcello Miller, outrora sócio do escritório TRW”.

“A denúncia ignora o fato de que o colaborador ou a empresa jamais solicitaram a emissão de uma fatura do TRW, tampouco tinham qualquer ingerência sobre os procedimentos internos do escritório de advocacia. Também não menciona que a J&F sequer pagou os valores ao escritório TRW, que está sendo processado pela má-prática profissional nesse episódio”, diz.

A defesa de Joesley afirma ainda que a denúncia “despreza todos os depoimentos e documentos aportados ao inquérito pela própria defesa, utilizando-se de majoritariamente de um procedimento administrativo conduzido de forma açodada pela PGR em setembro do ano passado”. Afirma que agora, sob o contraditório e ampla defesa, “será demonstrado que a acusação não só é descabida, como também descolada de qualquer elemento probatório”.

Em nota assinada pelo escritório Bottini & Tamasauskas, a defesa de Francisco de Assis reafirma que a J&F contratou o escritório Trench, Rossi e Watanabe —banca até então referência em integridade— para assessorá-la no acordo de leniência.

“Francisco de Assis não tinha motivos, portanto, para suspeitar de qualquer irregularidade na atuação de Marcelo Miller, sócio do escritório na área de ética e compliance”, afirma.

A defesa de Francisco reitera ainda que ele “colaborou efetivamente com a investigação, deixando claro que jamais discutiu honorários ou pagamentos com ou para Marcelo Miller, tampouco procurou obter qualquer vantagem ou benefício indevido no Ministério Público Federal por meio de Marcello Miller ou por qualquer outra pessoa, exatamente como consta do relatório da Polícia Federal”.

Em nota, a defesa de Esther Flesch recebeu com profunda indignação a notícia da denúncia. “Fica claro que Esther funcionou como inocente útil que precisou ser denunciada para que desse certo o projeto acusatório contra Marcelo Miller”, diz o advogado Fábio Tofic. (Reuters)