Cosméticos, carros de luxo, bebidas alcoólicas e herança. Pressionados pela crise econômica, a maioria dos governadores do país vem promovendo pacotes de aumentos de impostos sobre itens como os descritos acima para 2016.
Projeções dos governos apontam que os contribuintes devem pagar no próximo ano nos Estados ao menos R$ 8,58 bilhões a mais devido a aumentos dispersos.
A quantia, para se ter um exemplo, equivale a um terço do que o governo Dilma Rousseff espera arrecadar com a recriação da CPMF, proposta que vem provocando contrariedade no Congresso e no meio empresarial.
O aumento de impostos, aliado ao corte nos gastos públicos, é um dos principais pilares do ajuste fiscal que o governo federal vem tentando promover para pôr fim à crise.
A arrecadação de tributos dos Estados e do Distrito Federal neste ano deve superar os R$ 400 bilhões. Mas os governadores se queixam de dificuldade para manter em dia o pagamento do funcionalismo e de fornecedores.
Para aliviar as contas projetadas para 2016, eles se voltaram a itens classificados de “supérfluos”, e que acabaram sendo alvo de aumento de alíquotas. Celulares, joias, energéticos e produtos de lazer entraram no pacote. Em Sergipe, os aumentos incidiram até sobre artigos de sex shop e pranchas de surfe.
Em São Paulo, o governo Geraldo Alckmin (PSDB) elevou as alíquotas de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) da cerveja e do fumo. A arrecadação extra é estimada em R$ 1,38 bilhão –parte deste valor vai para os municípios. O governo sustenta que a alteração compensa a redução de imposto de itens da cesta básica.
As bebidas alcoólicas viraram alvo de outros nove governadores. Eles argumentam que onerar este tipo de mercadoria gera menos impacto na cadeia produtiva e não penaliza os mais pobres.
Uma outra frente de alterações foi o imposto sobre heranças e doações que é cobrado pelos governos estaduais. Em ao menos oito Estados e no Distrito Federal, o modelo de cobrança foi revisto, o que incluiu a criação de alíquotas mais altas para patrimônios mais elevados.
O IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), outra fonte de receitas expressiva dos governadores, também foi incluído no pacote de aumentos progressivos em algumas partes do Brasil. Em Pernambuco, por exemplo, veículos com maior potência pagarão 4% de IPVA. Antes, a cobrança se resumia a 2,5%.
A mudança de maior volume em relação ao IPVA será a do Rio, onde o governo estima arrecadar R$ 550 milhões extras em 2016 com reajustes das alíquotas de carros flex e movidos a gás natural.
Outros nove Estados reajustaram ainda a alíquota básica do ICMS.
RESISTÊNCIA
O tarifaço não foi aprovado sem enfrentar antes alguma resistência. No Rio Grande do Sul, Estado mais endividado do país, entidades empresariais fizeram campanha contra o reajuste do ICMS proposto pelo governador José Ivo Sartori (PMDB), que acabou sendo aprovado por apenas um voto.
Em São Paulo, Alckmin teve que diminuir o alcance de seu projeto sobre o ICMS para conseguir aprová-lo.
A CervBrasil, entidade da indústria da cerveja, diz que, sob o argumento de cobrar mais impostos por mercadorias não essenciais, os governos estão tomando medidas recessivas que podem contribuir para o desemprego.
O presidente da Associação Brasileira da Televisão por Assinatura, Oscar Simões, também critica os aumentos. Em outubro, o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) autorizou 15 Estados e o DF a alterar a alíquota do ICMS sobre o serviço de TV paga de 10% para 15%. “Cria um ambiente de negócios onde a regra do jogo vai sendo mudada, o que é ruim”, diz.
O economista Mansueto Almeida, que foi coordenador de política monetária do Ministério da Fazenda no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), critica a mudança constante de regras e a desconexão entre as medidas defendidas pelos governadores e as políticas que vem sendo adotadas pelo governo federal.
“Os governadores estão sobrevivendo. Os ajustes fiscais feitos são ruins, não resolvem o problema e empurram a situação com a barriga”, afirma.
Entre os governos que dizem que não irão subir impostos em 2016 está o do Paraná. O governador Beto Richa (PSDB) aprovou um pacote de aumentos ainda em 2014.
AUMENTO COMBINADO
Os governos discutiram em grupo alternativas para enfrentar a crise fiscal e chegaram a conclusões sobre a necessidade de ampliar a taxação de mercadorias consideradas supérfluas e sobre doações e heranças, segundo secretários estaduais da Fazenda ouvidos pela Folha.
O secretário do Distrito Federal, Pedro Meneguetti, diz que o assunto vem sendo tratado de maneira espontânea também em reuniões do Confaz, conselho subordinado ao Ministério da Fazenda que reúne os secretários estaduais dessas pastas.
“Os Estados estudaram outros Estados e tentaram fazer um nivelamento [de alíquotas]”, disse.
O governo do Distrito Federal discutiu o assunto principalmente com Estados vizinhos. No Nordeste, a situação se repetiu.
O secretário de Alagoas, George Santoro, diz que a maioria “seguiu a mesma lógica”. A ideia, diz, era fazer mudanças que afetassem pouca gente, principalmente a classe mais alta.
“Ninguém aumenta tributo porque quer. A gente está aumentando porque seria muito pior para a economia não pagar funcionários [públicos] ou fornecedores. O impacto na economia seria avassalador”, afirma.
Em outras partes do Brasil, governos adotaram discurso parecido. Antes de aprovar o pacote, o governador gaúcho José Ivo Sartori (PMDB) argumentou à Assembleia que o Estado estava na “UTI” e que havia esgotado todas as outras fontes de recursos, como o uso de depósitos judiciais e de novos empréstimos.