Para ajudar a nora, o aposentado andreense de 75 anos, que preferiu não se identificar, precisou pedir empréstimo no ano passado. O valor, por volta de R$ 8.000, foi para completar o montante de R$ 28 mil que sua companheira, a pensionista, que também não quis ter o nome revelado, 75, da mesma cidade, já tinha financiado para a mesma finalidade, com o desconto no benefício da Previdência Social, mas a quantia não era o suficiente.

Situações como esta são cada vez mais comuns. De acordo o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), a demanda por crédito consignado por aposentados e pensionistas das sete cidades cresceu 9,32% no ano passado, quando comparado ao número de contratos assinados em 2014. O levantamento, feito pelo órgão a pedido do Diário, aponta que os beneficiários contrataram 322.428 operações em 2015, o que significa 27.512 a mais do que no ano anterior.

Para se ter ideia do quanto isso representa, o volume de contratos assinados supera o total de aposentados na região, que em janeiro deste ano era de 302.976. Somados ao número de pensionistas, que estava em 115.155, a quantidade de operações feitas no ano passado representa 77% do total de beneficiários. É importante lembrar que não estão na conta os segurados que recebem benefícios de caráter assistencial, como os auxílios, já que esses não têm direito ao consignado do INSS.

Segundo o instituto, o valor total emprestado foi de R$ 1,33 bilhão, quase R$ 40 milhões a mais do que em 12 meses, quando a quantia somava R$ 1,29 bilhão – incremento de 3,09%.

ESTÍMULO – Um dos motivos que colaboraram para o aumento da procura por crédito e do volume financiado é o endividamento da maioria das famílias nos dias de hoje, devido à situação de crise da economia do País, conforme analisa o educador financeiro da DSOP, Edward Claudio Júnior. “O achatamento da renda e a falta de educação financeira acabam ganhando destaque com a turbulência econômica. Isso faz com que a procura por empréstimos comecem a aumentar”, afirma.

O diretor de políticas sociais da Associação dos Aposentados e Pensionistas do Grande ABC, Luís Antônio Ferreira Rodrigues, complementa. “Não é de hoje que o aposentado recebe um salário que não corresponde à realidade de vida à qual ele é submetido. Com a crise, essa situação se agravou. Como se trata de um empréstimo com juros menores do que a maioria, o consignado do INSS acaba parecendo atrativo”, declara Rodrigues.

Os juros do consignado são os menores do mercado, se comparado às modalidades de crédito para consumo disponíveis. No último boletim de operações de crédito do Banco Central, que abrange o período de 21 a 27 de janeiro, as taxas em bancos e financeiras para um empréstimo pessoal variavam de 1,66% a 20,04% ao mês, enquanto as do crédito consignado do INSS saíam de 1,87% a 2,46%. A diferença se dá devido à garantia que se tem de pagamento pelo fato de o desconto da parcela ocorrer diretamente no benefício da Previdência, e ao limite de 30% de comprometimento da aposentadoria ou pensão, que se estende a 35% se houver dívida de cartão de crédito.

Mas, para o diretor de políticas sociais, é um engano achar que se está fazendo um bom negócio ao pedir o empréstimo. “Se com o salário da aposentadoria já é difícil se manter, imagina com o desconto do crédito. Com o valor do benefício menor, o endividamento acaba virando uma bola de neve, e é assim que o indivíduo acaba se afundando no sistema financeiro.”

LIMITE – O aumento do volume da demanda de consignados em 2015 contra 2014, de 9,32%, é menor do que o de 2014 contra 2013, que foi de 17%. Para o educador financeiro, a explicação para crescimento menor no ano passado é que os aposentados e pensionistas estão chegando no limite do endividamento. “Hoje, as instituições financeiras estão muito mais criteriosas para conceder o empréstimo, porque as pessoas já estão com outras dívidas ativas. Apesar de o consignado descontar direto do benefício, se o aposentado não tiver mais dinheiro, ele vai ter que recorrer a outros empréstimos para se manter, e isso se transforma em um ciclo vicioso”, assinala Claudio Júnior.

Segundo a Pesquisa Socioeconômica do Inpes/USCS (Instituto de Pesquisa da Universidade Municipal de São Caetano), a cada quatro famílias da região, uma está com contas em atraso, ou seja, 25,3% do total. Em 2014, eram 21%.

PEDIDO DE FAMILIARES – Para o representante da entidade dos aposentados, por conta dos juros menores, muitas vezes o destino do recurso é para ajudar familiares. “Hoje, o aposentado acaba sendo arrimo de família. Pelas condições mais atrativas do empréstimo, filhos e parentes preferem recorrer a quem pode conseguir crédito consignado do INSS.”

Esse foi justamente o caso do aposentado citado no início da reportagem que, junto da companheira, emprestou total de R$ 36 mil, a pedido da nora. “A gente fica com medo, porque se uma hora a gente precisar para uso próprio, não vai ser possível, porque já atingimos o limite de crédito consignado de cada um”, lamenta.