Dezenas de imagens retratam sensações de sorriso, choro, raiva e medo.
Download da ferramenta é gratuito e disponível para tablets com Android.

Um software desenvolvido por estudantes da Universidade de Brasília tem auxiliado na inclusão digital e social de autistas clássicos ao ajudá-los na identificação de expressões faciais. As dezenas de fotos e vídeos com asiáticos, brancos, negros, pessoas de diversas idades e representantes de ambos os sexos – trazem reproduções de sorrisos, choro, raiva e medo. O download da ferramenta é gratuito e disponível para tablets com sistema operacional Android.

“As escolas ainda estão aprendendo a lidar com autistas. As famílias estão sedentas por recursos, por qualquer coisa que possa auxiliar”, explica o orientador do projeto, o professor Wilson Veneziano. “O objetivo é trabalhar expressões faciais. Isso é diferente de sentimentos. A gente não pode falar de sentimentos, no caso do autista, porque a gente não sabe o que se passa na mente dele. O fato de ele aprender a reproduzir uma expressão de sorriso não implica que ele aprendeu a interpretar aquilo como felicidade.”

Segundo Veneziano, a ideia de trabalhar com tantas imagens para quatro expressões tem a ver com a dificuldade que autistas têm de fazer a transposição do que veem e tenderem à literalidade. Uma das características da síndrome é a dificuldade e até impossibilidade de abstração.

“Comumente os autistas têm uma tendência a não manifestar [sentimentos]. Eles têm dificuldade de interpretar as expressões faciais e também de expressá-las. O rosto está sempre igual. Trabalhar as expressões sociais aumenta a inclusão dele, aumenta a interação social”, completa.

O desenvolvimento do software Expressar levou um ano e meio. Crianças, jovens e adultos da rede pública testaram a ferramenta. Tendo o programa como trabalho de conclusão de curso em ciências da computação, Diego André Santos conta que achou que imaginava que o desenvolvimento foi mais fácil do que imaginou.

“Eu nunca tinha tido experiência com a parte de deficiência e educação especial, mas conforme foi passando [o tempo] eu vi que era possível.  Fiquei bem satisfeito com o resultado, inclusive as professoras deram retorno para a gente sobre o uso da ferramenta na escola, passaram uma visão bem positiva”, diz.

Ele conta que tem um primo com síndrome de Down e que vê as dificuldades que ele tem com socialização. “Esse software ajuda as pessoas a conviverem de uma forma melhor na sociedade. Aprendendo a reconhecer as expressões, se a pessoa está feliz ou triste, certamente é importante para elas serem incluídas. Vejo que ele [meu primo] tem dificuldades em algumas coisas, então acho que é essencial que essas novas tecnologias sejam usadas para isso.”

O projeto foi desenvolvido com parceria com a UnBTV, que produziu os vídeos utilizados no programa. O outro estudante envolvido no Expressar, Wellington Souza, conta que o maior desafio foi se colocar na posição da pessoa com autismo. Ele diz ter aprendido muito durante o processo de pesquisa e aprofundamento do tema.

“Sempre tive em mente fazer algo que fosse produtivo, proveitoso, não só para mim, mas para outras pessoas também”, completa. “Sempre acreditei que a tecnologia pode e deve ajudar a educação, andar de mãos dadas as duas, principalmente em um ramo tão nobre como o autismo.”

Na prática
Professora da rede pública e especialista em autismo, Mara Rúbia Martins conta que o Expressar colabora para as interações feitas por crianças e jovens que tenham a síndrome no maior grau de comprometimento. “O ganho social é substancial, pois o estudante entende o significado das expressões faciais, o que facilita a comunicação, favorecendo assim a inclusão social.”

O Expressar foi desenvolvido dentro de um projeto voltado a pessoas com deficiência intelectual. Os outros softwares, criados ao longo dos últimos seis anos, são Participar (alfabetização), Somar (aplicabilidade social da matemática) e Aproximar (gestos). Os programas são utilizados por milhares de escolas públicas brasileiras, pela rede Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e por instituições de Portugal e Angola.

Dados da Secretaria de Educação apontam que, em 2015, 8 mil estudantes do DF tinham alguma deficiência intelectual. Os casos dentro do espectro autista somavam 1,5 mil. Ao todo, a rede pública tinha 470 mil alunos.