Autorização da Arsesp foi comunicada pela Sabesp.
Em fevereiro, multas renderam mais à Sabesp que valor gasto com o bônus.

A agência que regula o setor de saneamento e de energia no estado de São Paulo, a Arsesp, autorizou a Sabesp a cancelar a concessão do bônus para quem economiza água e a aplicação da multa para os que aumentaram o consumo. A medida valerá a partir das leituras a serem realizadas em maio, segundo informações do Bom Dia São Paulo.

A decisão foi tomada na quarta-feira (30) e divulgada pela Sabesp na quinta-feira (31) em sua página para investidores.

O bônus e a multa foram algumas das medidas adotadas pelo governo a partir de 2014 para o combate à crise hídrica no estado. O Sistema Cantareira, responsável por abastecer 5,7 milhões de consumidores no estado, operou no volume morto por 19 meses e só saiu do “vermelho” em dezembro de 2015. No último dia 7, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), disse que “a questão da água está resolvida no estado”.

Também em dezembro do ano passado, a Sabesp pediu à Arsesp autorização para conceder o bônus e a multa até o final de 2016 ou até que houvesse maior previsibilidade da situação hídrica. Agora, a companhia diz que “a situação hídrica atual permite uma maior previsibilidade sobre as condições dos mananciais”. O Cantareira, por exemplo, opera com 36,1% de volume útil na quinta-feira.

Arrecadação em fevereiro
No mês em que a Grande São Paulo atingiu taxa recorde de multas para os clientes que aumentassem o consumo de água, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) arrecadou R$ 50,8 milhões com a tarifa de contingência. Em fevereiro, a empresa também deixou de faturar R$ 36,3 milhões por causa do bônus para quem economizasse água. Foi a primeira vez que a arrecadação com a multa superou as perdas com o bônus.

A sobretaxa começou a ser cobrada em fevereiro do ano passado. Em 2015, a Sabesp faturou R$ 499,7 milhões com a tarifa de contingência, mas deixou de arrecadar R$ 926,1 milhões com o desconto na conta.

“Nós sempre afirmamos e voltamos a reiterar que o objetivo tanto de um quanto de outro [bônus e multa] era ajustar a demanda de água com a oferta. Em nenhum momento nós tivemos o objetivo arrecadatório com a tarifa de contingência. Tanto não é assim que no primeiro mês que a tarifa de contingência supera o bônus, nós protocolamos o pedido de suspensão de ambos”, afirmou o diretor econômico-financeiro e de relações com investidores da Sabesp, Rui de Britto Affonso, durante conferência com investidores nesta terça-feira (29).

Desde fevereiro, a Sabesp já adotava um novo cálculo para a concessão do bônus com base em um Consumo Médio de Referência (CMR). Até o fim de 2015, o CMR correspondia à média de consumo no período fevereiro 2013 a janeiro 2014. Já o novo CMR passou a ser calculado pela multiplicação do antigo CMR por 0,78, o que na prática tornava a obtenção de bônus mais difícil.

Os moradores que conseguiam economizar entre 10% e 15% tinham desconto de 10% na conta. Os que diminuíam o gasto entre 15% ou 20% recebiam bônus de 20%. Já as residências que economizavam 20% ou mais recebiam desconto de 30% na conta de água. A cobrança das multas não foi alterada. Residências que consumiam até 20% além da média pagavam conta 40% mais cara. Já as que excederem os gastos em mais de 20% recebiam multa de 100% no fim do mês.

Queda no lucro e fim do bônus
A crise hídrica impactou os lucros da Sabesp pelo segundo ano seguido em 2015, e a companhia projeta cortar pela metade novamente os investimentos nos serviços de água e esgoto previstos para 2016. É o que aponta o balanço divulgado na sexta-feira (25) pela empresa, em página voltada a investidores.

O relatório mostra que a companhia teve lucro líquido de R$ 536,3 milhões em 2015, 40,6% menos que os R$ 903 milhões do ano anterior. O desempenho é bem inferior ao de anos anteriores à seca, como 2012 e 2013, quando a companhia lucrava mais de R$ 1,9 bilhão.
No balanço, a Sabesp informa ainda que pretende reduzir os investimentos em 48,3% em 2016.

No total, está previsto R$ 1,8 bilhão para os serviços de água, tratamento e coleta de esgoto, número inferior ao de 2015 – aproximadamente R$ 3,4 bilhões. No início de 2015, a Sabesp já havia anunciado um corte de cerca de metade dos investimentos previstos.

Os reajustes não conseguiram livrar a Sabesp da queda no lucro líquido. A empresa comemora, porém, o aumento da receita operacional líquida, que ficou em R$ 11,7 bilhões em 2015, um acréscimo de 4,4% em relação a 2014. Já os custos e despesas, sinalizados no relatório com uma seta verde indicando desempenho positivo, caíram 5,2%.

Os impactos da crise hídrica aparecem em diversos pontos do balanço. O volume de água produzido pela Sabesp caiu 13,1% em 2015, assim como o volume efetivamente faturado nas contas, que caiu 8%. Outro número destacado pela Sabesp foi a concessão de R$ 926,1 milhões em bônus em 2015, o que ocasionou perda de 6,2% na receita operacional bruta.

Aumento de vazamentos
A Sabesp registrou aumento nos vazamentos nas tubulações depois que a empresa ampliou a pressão na rede de distribuição na Grande São Paulo. No fim do ano passado, com a recuperação dos reservatórios, a companhia diminuiu de 15 horas para sete horas, em média, o período diário de redução de pressão, e foi liberado mais água na rede.

A perda por vazamento, segundo o presidente da companhia, Jerson Kelman, “é um preço a pagar” para melhorar as condições de abastecimento para população.  “Nós vamos encolher o período de redução de pressão e isso significa, inescapavelmente, aumentar as perdas. Tem que passar por esse processo e nossas equipes estão trabalhando freneticamente para resolver esses problemas”, afirmou em entrevista ao G1.

A redução foi responsável por mais da metade de economia de água retirada do Sistema Cantareira durante a crise. Segundo Kelman, durante dois anos, as tubulações receberam menos pressão. Agora, com as válvulas reabertas por um período mais longo, as ocorrências de vazamentos aumentaram. “Aumenta a pressão e começa a ‘pipocar’ [os problemas] porque você começa a submeter as tubulações a pressões que não existiam antes e que, por isso, não arrebentavam. Mas, agora, elas passam a arrebentar”, disse o presidente da companhia.

Reação ao fim da crise
Desde que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), anunciou que a crise hídrica estava resolvida, moradores de diferentes regiões da capital relataram falta d’água em casa(assista nos vídeos abaixo). Já a Sabesp defende que a torneira seca não é resultado da redução de pressão na rede, e cita outros motivos, como falta de caixa d’água nas residências, manutenção na rede ou queda de energia em uma estação elevatória, por exemplo.

O presidente da Sabesp, no entanto, afirmou que a crise hídrica fez com que o controle de pressão durante a madrugada fosse “espalhado” pela cidade. “Há vários bairros da região metropolitana que, anteriormente à crise, não tinham válvula redutora de pressão e agora têm. Isso quer dizer que, se uma pessoa que vive em um ponto alto de uma região que antes da crise não tinha gestão de pressão porque não tinha válvula, agora tem”, disse Kelman.

A Sabesp defende que as válvulas são parcialmente fechadas entre 23h e 5h porque é um período de consumo menor. Uma pressão sem ajuste, nesse caso, poderia causar mais danos às tubulações. “Ninguém quer fazer com que a população seja prejudicada. Não interessa ninguém isso”, concluiu.

Aumenta a pressão e começa a ‘pipocar’ [os problemas] porque você começa a submeter as tubulações e as válvulas a pressões que não existiam antes e, que por isso não arrebentavam. Mas, agora, elas passam a arrebentar”
Jerson Kelman, presidente da Sabesp

‘Pior passou’
Jerson Kelman disse que a crise hídrica vivida desde 2014 não deve se repetir este ano, segundo uma projeção feita por técnicos da Sabesp, em parceria com a USP. Questionado se a população poderia deixar de economizar ao perceber que o risco de desabastecimento é menor, o presidente da companhia defende que a crise deixou, como “legado”, a consciência da população sobre o valor da água e sobre a necessidade de não desperdiçar a água.

“Durante a crise, muitos fizeram mais do seria o usual no sentido de uso parcimonioso, foi quase um comportamento em situação de guerra, sacrifício, economia extrema. O que nós sentimos necessidade de compartilhar com a população foi a informação é de que o pior passou, e que esses comportamentos extremados não são mais necessários. Agora nós não estamos dizendo: ‘bom, a crise acabou e agora liga o chuveiro, deixa o chuveiro aberto’. Não, nada disso. Continue economizando água”.