Melhora do mercado de trabalho não vai impedir que o rombo recorde fique maior, dizem especialistas; necessidade de ajuda para pagar benefícios chegará a R$ 20 bilhões em 2018.
O fundo que paga o seguro-desemprego e o abono salarial (PIS) vai precisar cada vez mais da ajuda do Tesouro para cumprir suas obrigações. Mesmo com a retomada da economia, o governo prevê que os gastos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) vão aumentar, fragilizando ainda mais sua capacidade de pagar os benefícios com recursos próprios.
O FAT é o fundo de onde sai o dinheiro para o pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial. Os recursos são arrecadados de impostos e tributos. Quase metade desta receita é destinada para custear as operações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES).
O fundo teve uma arrecadação de R$ 71,6 bilhões em 2016 e gastos de R$ 56 bilhões. Mas, como parte desses recursos são desviados para outros fins, falta dinheiro para arcar com os gastos de seguro-desemprego e abono salarial. Para a conta fechar, o FAT precisa de aportes do Tesouro Nacional.
O problema é que, em meio a um forte aperto fiscal, podem faltar recursos para cobrir o rombo cada vez maior do fundo. Para 2017, o governo terá que injetar R$ 18 bilhões e, no ano seguinte, esse montante pode chegar a R$ 20,6 bilhões, segundo a proposta de orçamento aprovada em junho pelo Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo). Em 2016, a injeção de recursos foi de R$ 12,5 bilhões.
Esta necessidade de repasse compromete diretamente a meta fiscal do governo, que subiu para um déficit primário de R$ 159 bilhões.
Procurado, o Tesouro Nacional informou que o aporte de 2017 já consta na Lei Orçamentaria Anual de 2017 e que, em relação à ajuda para 2018, “a proposta orçamentária ainda não foi finalizada“.
O Codefat, subordinado ao Ministério do Trabalho, informou que a última projeção “será revista quando das novas estimativas de gastos com pagamento de benefícios do abono salarial, com base nos novos dados da RAIS”.
Dependência crescente do Tesouro
A dependência do FAT do dinheiro do Tesouro é crescente. Em 2012, ele conseguia pagar 80% dos gastos do seguro-desemprego com recursos próprios. Esse número caiu para 67% em 2016, mostram dados do Ministério do Trabalho enviados ao G1. Ou seja, o fundo passou a depender mais da ajuda do Tesouro para pagar o restante dos benefícios.
A crise econômica piorou esse quadro. Com o desemprego em alta, os gastos do governo com o seguro-desemprego saltaram de R$ 5,2 bilhões, em 2012, para R$ 12,6 bilhões em 2016.
Problema é estrutural
O déficit do FAT vem de longa data, mas a piora no mercado de trabalho em tempos recentes enxugou a arrecadação do fundo e elevou ainda mais os gastos com o seguro-desemprego, agravando seus problemas financeiros.
Para o consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados, Leonardo Rolim, o rombo é estrutural e não vai se resolver apenas com o aumento das contratações no mercado de trabalho. O pleno emprego na última década, segundo ele, também ajudou a complicar a situação do fundo.
“O Brasil tem uma rotatividade elevada e, quando há muita oferta de emprego, isso ajuda a aumentar os gastos com seguro-desemprego, ao contrário do que acontece em outros países”, diz. “Quando o Brasil gera 1 milhão de empregos, 19 milhões foram contratados e 18 milhões, demitidos”, exemplifica Rolim.
Por este motivo, mesmo que a economia se recupere em breve e o desemprego caia, o FAT continuará deficitário, na visão de Rolim. Para 2018, o Conselho Deliberativo do Fundo (Codefat) prevê que as despesas totais do FAT vão aumentar 4,3% em relação a 2017, de R$ 75,4 bilhões para R$ 78,7 bilhões.
A política de valorização do salário mínimo foi outro causador da piora nas contas do FAT, explica a professora de economia da Fecap, Juliana Inhasz. “Isso aumentou os gastos com o abono salarial, que tem os benefícios vinculados ao valor do mínimo. Quando ele cresce, o pagamento fica maior”.
Desvio de recursos
A receita do fundo vem das contribuições do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP). Mas 30% destes recursos são desviados para outros fins, pelo mecanismo chamado Desvinculação de Receitas da União (DRU).
Por lei, o governo pode remanejar a receita de todos os impostos e contribuições federais como quiser, contanto que respeite este limite. Isso serve para deixar mais livres as despesas previstas no Orçamento, mas reduz a capacidade do FAT de se “bancar” sozinho.
Em meio à crise fiscal, a intenção do governo é que o Tesouro deixe de aportar os recursos no FAT para compensar a DRU, afirma Rolim. “Se isso acontecer e nada mais for feito, a saída será começar a resgatar os recursos que estão no BNDES(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social )”, afirma.
O BNDES tem o FAT como sua principal fonte de recursos. O fundo destina no mínimo 40% de sua arrecadação ao banco de fomento. Em junho deste ano, o saldo de recursos do FAT no BNDES era de R$ 240 bilhões. Em 2016, o FAT transferiu R$ 15,3 bilhões de suas receitas para o banco.
O banco de fomento confirmou que está negociando com o governo a devolução de recursos do FAT. Não, no entanto, uma definição de quanto será devolvido nem quando.
Para Rolim, a devolução dos recursos do BNDES não é a melhor alternativa. Ele entende que o governo precisa encontrar outras soluções que aumentem a arrecadação do FAT.
“Na minha visão, a melhor saída é regulamentar a contribuição sobre a rotatividade nas empresas, fazendo com que os empregadores que tem rotatividade maior paguem mais”, sugere.
Inhasz, da Fecap, vê como alternativa a emissão de mais títulos de dívida do governo para cobrir o rombo. Isso, no entanto, trará um aumento da dívida pública e a consequente piora do quadro fiscal. “O cobertor está muito curto, não tem como cobrir sem tirar de outro lugar.”