Governadores de estado farão reunião virtual sem a participação do presidente da República; Caiado anuncia rompimento e ministro da Saúde pode sair
Nesta quarta (25), após encontro com os quatro governadores do Sudeste em que João Doria, de São Paulo, bateu boca com o presidente, foi anunciada uma reunião entre os 27 mandatários de todos os estados do país. Bolsonaro não participará.
Durante a discussão, Doria afirmou que Bolsonaro deveria “dar exemplo ao país, e não dividir a nação em tempos de pandemia”. O presidente da República mandou o governador “sair do palanque” e lembrou de ele ter-se beneficiado da chapa “Bolsodoria” para se eleger.
As cobranças em relação a Bolsonaro, no entanto, vieram também de outros governadores, como Renato Casagrande (PSB), do Espírito Santo.
“Algumas medidas têm nos angustiado e entendemos que é preciso ter uma coordenação nacional. Estamos sentindo que em todos os momentos que fechamos uma posição, a gente recebe esse ambiente de confronto. Não deixamos a economia de lado, mas não podemos menosprezar e desconsiderar as informações dos cientistas de todo o mundo”, disse Casagrande.
Para o pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e Fundação Getulio Vargas Vinicius Gomes Wu, desde ontem esse Bolsonaro isolado, aparentemente, age pra oferecer argumentos aos seus seguidores mais fieis e coesionar sua tropa.
“O isolamento do núcleo bolsonarista mais orgânico é evidente. Ontem isso ficou ainda mais explícito. Mas, suas redes se mantêm ativas e, na medida em que tenham uma orientação clara, podem atuar no sentido de expandir sua influência”, avalia.
Para Gomes Wu, um dos idealizadores do Sala de Democracia Digital da FGV, a linha de Bolsonaro, de repetir insistentemente que a gripe vai “matar mais CNPJs do que CPFs”, tem servido ao propósito de animar esta parcela mais fiel de seu eleitorado. “Por outro lado, ontem observamos um maior alinhamento entre o ‘centro’ e a ‘esquerda’ – uma aproximação do discurso daqueles que mantinham uma posição mais ‘neutra’ e os que fazem oposição aberta ao atual governo. Um bom sinal.”
Saúde desfalcada
O cenário de um Bolsonaro isolado politicamente também pode ser agravado pela saída de integrantes da equipe do Ministério da Saúde. Segundo informações que circulam nos bastidores do governo, em Brasília, o ministro Luiz Henrique Mandetta pode deixar o cargo. Ele teria avisado que manterá sua defesa de que os cidadãos devem permanecer em isolamento social geral. Bolsonaro defende que esse isolamento seja “vertical”, ou seja, somente dos idosos e outras pessoas com alto risco de adoecimento.
O diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde já se afastou. Colocado em férias até abril, não deve retornar ao posto. Informações divulgadas pelo jornal O Globo dão conta de que seu afastamento deve-se a divergências com o secretário de Vigilância em Saúde do ministério, Wanderson de Oliveira.
Aliados se afastam
Um dos principais aliados de Bolsonaro, desde a campanha eleitoral à Presidência da República, Ronaldo Caiado (DEM) anunciou hoje, em entrevista coletiva, seu rompimento com o presidente.
Médico, o governador de Goiás já havia se indisposto com apoiadores durante o ato de 15 de março. Hoje, em entrevista coletiva, criticou o pronunciamento de Bolsonaro, rotulando-o de irresponsável. “Dizer que isso é um resfriadinho, uma gripezinha? Ninguém definiu melhor que Obama: na política e na vida a ignorância não é uma virtude.”
Caiado disse que passou a noite refletindo sobre o assunto. “Será que o mundo todo está errado, a comunidade científica inteira? Tomo decisões médicas. Isso me causa indignação.”
O governador afirmou que os decretos de isolamento social para o combate à pandemia em seu estado continuarão valendo. Reclamou do desrespeito do presidente da República e avisou: só falará com Bolsonaro daqui para frente por meio de comunicados oficiais. “Fui aliado de primeira hora, durante todo o tempo. Mas não posso admitir que venha agora um presidente lavar as mãos e responsabilizar outras pessoas por um eventual colapso. Não faz parte da postura de um governante.”